O
pastor episcopal anglicano Steve Lawler, da Igreja Saint Stephen, optou
por observar a Quaresma de uma maneira incomum. Ele decidiu adotar os
rituais do Islã por 40 dias, segundo ele, “para obter uma compreensão
mais profunda dessa fé”.
Porém,
alguns de seus superiores sentiram-se desconfortáveis e ameaçaram
demiti-lo se continuasse com essa experiência. ”Ele não pode ser cristão
e muçulmano ao mesmo tempo”, explicou o bispo George Wayne Smith, da
diocese episcopal do Missouri. ”Se ele optar pelas práticas dos
muçulmanos, estará desistindo de sua identidade cristã e sacerdotal na
igreja.”
Lawler, que trabalha em tempo parcial na igreja, não
previa esse tipo de problema quando tomou essa decisão. Disse que apenas
queria saber mais sobre o Islã, especialmente depois de acompanhar a
discussão nacional nos Estados Unidos sobre a radicalização da fé.
Na
Quarta-feira de Cinzas, primeiro dia da Quaresma, ele começou a prática
do salah cinco vezes por dia, ajoelhando-se em direção a Meca e orando a
Alá. Também passou a estudar o Alcorão e adotou os costumes alimentares
islâmicos, abstendo-se de carne de porco e de bebidas alcoólicas.
Durante
a Semana Santa, ele planejava jejuar do amanhecer ao pôr do sol, como
os muçulmanos fazem durante o período do Ramadã. Mas aos olhos do bispo
Smith, a tentativa de “imitar” outra religião pode ser vista como algo
desrespeitoso. Ele explica: “Uma das formas [de Lawler] continuar sendo
um líder cristão é vivenciar o cristianismo e fazê-lo com clareza, não
de uma maneira tão confusa”.
Quando perguntado se puniria Lawler
se ele continuasse com os rituais, Smith respondeu que sim. E mais,
seria obrigado a tirá-lo do cargo.
No entanto, Lawler disse que
não tinha intenção de declarar a sua crença na unicidade divina e
aceitar Maomé como profeta de Deus. Este é o primeiro dos cinco pilares
do Islã, que marca a conversão de alguém ao islamismo.
Os
problemas de Lawler, que também é professor adjunto na Universidade de
Washington, começaram quando ele publicou um comunicado à imprensa
explicando como passaria a Quaresma.
Isso chamou atenção de um
repórter que decidiu entrevistá-lo. O pastor acabou explicando que não
via nenhum problema em conciliar sua visão episcopal com as do Islã.
Explicou também que esperava testar um conceito atribuído a Mahatma
Gandhi e abordado por John Dunne em “The Way of All the Earth” [O
Caminho de toda a terra]. Segundo o livro, “envolver-se com outra
cultura ou religião gera em nós uma nova visão sobre nossa própria
cultura ou religião”.
“Poderia apenas sentar e ler material
acadêmico sobre o Islã, mas continuaria um passo atrás, por isso decidi
ter um encontro pessoal com o islamismo”, disse o pastor Lawler, no
escritório da igreja onde está há oito anos. Ele ajudou a criar um
programa comunitário nessa paróquia, que inclui dança, aulas de música,
debates teológicos, projetos de melhorias para o bairro e um mercado dos
fazendeiros. Ele batizou o programa “A Vinha”, porque continua
crescendo e tomando rumos novos e surpreendentes. Foi desse modo que ele
viu sua aproximação ao Islã.
Nascido e criado em uma família
católica, Lawler tornou-se episcopal com pouco mais de 20 anos de idade
porque não compartilhava dos pontos de vista conservadores do Vaticano.
“A
Igreja Episcopal é bastante aberta”, disse ele. Teria sido bem mais
difícil [fazer os rituais islâmicos], “se eu fosse o pastor de uma
igreja muito conservadora”. Porém, dois dias depois de iniciar sua
“imersão cultural”, Lawler descobriu que a Igreja Episcopal é mais
rígida do que ele pensava. Após ouvir a reprimenda do bispo, Lawler
desistiu de fazer os rituais islâmicos.
“Gostaria que ele entrasse
em contato comigo antes de tomar uma decisão sobre isso”, disse Smith.
”Eu teria lhe dito para não fazer isso. Acredito que ele está tentando
mesmo aprofundar a sua compreensão do Islã, e isso é admirável. Mas
assim você desonra a outra fé, pois está só fingindo. Você precisa
construir pontes, ter um relacionamento real com nossos vizinhos
muçulmanos.”
Mohammed Ibrahim, presidente do conselho da Fundação
Islâmica de Saint Louis, diz não se ofender por Lawler praticar os
rituais islâmicos. ”Acho que essa é uma boa ideia para alguém
compreender melhor o que é o Islã. Nós o aplaudimos. As pessoas podem
vir e nos observar fazer as orações nas mesquitas e até participar da
oração, se quiserem”, explica.
Ibrahim acrescenta que os cristãos
poderão se surpreender com algumas semelhanças entre as duas religiões.
”Como a história da Virgem Maria e de Jesus Cristo”, disse ele. ”No
Alcorão, há um capítulo inteiro sobre a Virgem Maria.”
Lawler
disse que não ficou decepcionado com a reação da Igreja Episcopal. ”É um
diálogo. Não me sinto excluído ou censurado. Entendo as preocupações do
bispo Smith sobre o que isto significa”, conforma-se.
Depois de
tudo resolvido, o pastor decidiu realizar uma série de debates públicos
informais em sua igreja, que incluirá um muçulmano, um ateu, uma pessoa
“espiritual mas não religiosa” e alguém que “vive uma vida plena e
moral, mas sem nenhum fundamento espiritual ou religioso”. Esses
encontros começaram esta semana e devem durar até a Páscoa, que marca o
final da Quaresma.
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